quarta-feira, 11 de abril de 2012

Travessia Marins -Itaguaré 2012


Para o feriado da páscoa programávamos a travessia Rebouças – Mauá no Parque Nacional do Itatiaia, no Rio de Janeiro. Como demoramos a enviar o pedido de autorização necessário para realizar esta travessia, tivemos que alterar nossos planos.
Tínhamos combinado que se por qualquer motivo não fosse possível nosso plano principal, partiríamos para a cidade Piquete e realizaríamos a travessia Marins - Itaguaré
Esta travessia, uma das mais tradicionais do montanhismo brasileiro, passa pelo Pico dos Marins (2.421 alt.), pelo Pico do Marizinho (2.410 alt.) e Pico do Itaguaré (2.308 do alt.). Há dois anos tive a oportunidade de realizar está travessia, aliás tinha sido a minha primeira de verdade. Justamente nesta, passei o maior perrengue com falta d’água, por isso seria interessante o retorno para verificar certas impressões.
Decidido o roteiro, partimos às 5 da manhã da sexta eu, Eduardo Bisan, Sandro e claro que ela não poderia falta, minha menina, minha parceira e melhor companheira Vivi. De outro canto da cidade partiram André, Vavá (um tcheco residente em nosso país) e Lissandra.
Por volta das 9 e meia da manhã chegamos à rodoviária de Piquete para encontrar com o Andre e Cia. Uma pausa para um café da manhã meia boca na rodoviária e mais uma parada para o Sandro terminar  de comprar seu jantar, partimos para o bairro dos Marins por volta das 10 e meia da manhã.
A única referência que eu tinha como tempo de caminhada era a que eu tinha feito anteriormente, por isso estava preocupado com o horário. Comentei com a Vivi que não podíamos partir depois do meio dia se não ficaria complicado chegar com luz natural.


Chegamos à “Ranchonete” e começamos a finalizar os ajustes finais das nossas cargueiras. Como não combinamos o resgate com ninguém, precisávamos falar com o Milton (dono da ranchonete) para que ele providenciasse um para nós, porém ele não estava naquele momento.
Para nossa sorte, ele não demorou a chegar. Ajustamos o resgate, tiramos a clássica foto com os integrantes da empreitada, nos despedimos da Lissandra que ficaria numa pousada da região e partimos rumo ao morro do Careca por volta das onze e meia da manhã.
A subida do morro do Careca é feita por uma antiga estrada de terra que se encontra fechada para veículos. Em 50 minutos chegamos ao topo sem maiores esforços, subidinha leve só para aquecer a musculatura, pois a partir daquele momento tudo seria muito pior.
Paramos para abastecer nossos estoques de água, pois não era certo que haveria água para hoje e amanhã pelo restante do caminho (há um rio no próximo a base do Marins, porém ou ela está seca ou imprópria para o consumo). Por isso, levamos cerca de 4 litros de água cada.
Estoque de água abastecido, agora era só tocar para cima. A trilha é óbvia no começo até cair no paredão rochoso, depois basta seguir os totens de pedra.
Não tivemos maiores dificuldades na navegação e prosseguimos em um bom ritmo. A vista da região da Mantiqueira realmente impressionava quem já a viu anteriormente da mesma forma que os novatos.
Em nosso horizonte “mar” de morros e serras se estendiam pelo horizonte com vários tons de verde, por isso cada pausa para recuperar o fôlego era bem vinda.
Durante a subida os trechos de escalaminhada era uma prévia do que seria o dia seguinte. Alguns eram bem verticais, mas bem protegidos, ou seja, sem perigo de cair em algum abismo.  Particularmente gosto muito deste tipo de terreno, torna a caminhada mais agradável, pois exige força nos braços também.
Para nossa total surpresa chegamos ao acampamento base dos Marins (2.300 alt.) depois de três horas e meia de caminhada. Ficamos contentes com essa marca, pois havia tempo para atacar o cume ainda naquele dia.
Em uma das áreas de acampamento conhecemos o Valucio e o Andriano, ambos de Itanhadu, como sabíamos que no cume tinha pouco espaço para armar as barracas, perguntamos aos dois se eles tinham visto algum grupo passar em direção cume. Eles responderem que sim e isso fez com que ficássemos indecisos se subiríamos ou não.
Antes de partimos, os nossos dois colegas montanhistas, perguntaram se poderiam seguir conosco amanhã, pois não conheciam o caminho. Respondemos que não havia problemas e combinamos um horário com eles.
Outro problema que nos infligia era a tempestade que estava formando. Subir o paredão rochoso até o cume com a rocha molhada seria uma missão bem arriscada.
Quando decidimos que o melhor a fazer era arriscar o ataque naquele momento mesmo, a chuva começou a cair e decidimos montar acampamento ao lado da nascente (estava com água corrente).
O relógio não marcava quatro da tarde e já estávamos montando acampamento. Nesta hora o Vava percebeu que tinha esquecido uma das varetas de sua barraca. Calma! ninguém aqui é Bear greals, mas todos sabem como improvisar uma barraca e lá fomos nós quebrar a cuca para armar aquela barraca.
Assim, usando os bastões de caminhada da galera conseguimos improvisar e a barraca estava pronta para ser usada, desde que o vento não castigasse muito, mas estávamos em lugar bem protegido do vento, por isso acreditamos que ela restitiria.
Antes do crepúsculo do dia, fomos agraciados um belo arco-íris. Nem bem o sol se pôs estávamos comendo nossos jantares. Nesta noite em especial, eu e a Vivi dividimos nossa comida com o Sandro. Mandamos uma “bela” feijoada da Vapza.
Nem bem terminei de jantar e reparei que atrás do pico dos Marins tinha umas nuvens mais claras, como se estivessem iluminadas por alguma coisa. Pelo horário, pensei que fosse os últimos raios de sol tingindo aquela nuvem, porém para a minha surpresa não era o sol que estava fazendo aquele efeito e sim a lua.
Ela surgiu por detrás da montanha alumiando todo o vale entre o pico dos Marins e do Marinzinho. Lindo demais! Essa imagem, mais o arco-íris mostram que a natureza recompensa todo o sofrimento da subida que o montanhista passa. Fome, sede, frio, cansaço tudo isso é pequeno perto das maravilhas que só os motanhistas veem com a ‘lente’ de seus olhos.
Fomo dormir cedo, pois nosso objetivo era acordar às cinco da manhã, realizar o ataque ao cume para assistir o sol nascer. Um temporal caiu logo após que entramos em nossas barracas, mas felizmente a barraca improvisada de nossos amigos resistiu.
O relógio despertou 5h da manhã, porém o frio que fazia desencorajou todos a sair dos seus respectivos sacos de dormir. Só por volta das seis da manhã que tive coragem de sair da barraca e animar os demais.
Em pouco tempo chegamos ao cume e lá ficamos por cerca de meia hora a quarenta minutos tirando fotos e admirando o caminho que faríamos naquele dia.
De volta ao acampamento, preparei o café enquanto a Vivi arrumava todos os equipamentos para nossa partida.
Terminamos de arrumar nossas coisas e às nove horas e trinta minutos seguimos rumo à base do Itaguaré. Esta parte na outra vez que fiz, foi a mais complicada do percurso. Tomamos vários perdidos e tivemos que dormir no meio do caminho, por isso estava um pouco preocupado com o horário.
Seguimos rumo ao cume do Marinzinho e em 50 minutos de caminhada alcançamos o seu falso cume. Paramos para apreciar o visual e brincar de pular a divisa dos estados de SP e MG (a divisa passa exatamente em cima do Marinzinho).
Mais meia hora estávamos descendo o Marinzinho pelas cordas. Tinham três cordas, uma podre e as outras duas mais novas, porém com uma ancoragem duvidosa.
Após passar por este lance mais complicado descemos e subimos dois vales para chegar exatamente ao meio dia e meio na Pedra Redonda para nossa pausa para almoço. Até esse momento o sol não castigava muito, pois havia algumas nuvens que davam certo alívio para nós, o que tornava a caminhada agradável.
Após uma hora de descanso e mesmo com aquela moleza pós-refeição seguimos rumo à base do Itaguaré. Neste ponto eu já estava mais tranquilo e sabia que tínhamos tempo de sobra para completarmos nosso objetivo.
Ao contrário da parte da manhã, o sol na parte da tarde castigou o tempo todo. Nenhuma nuvem para nos ajudar.
Depois da pedra Redonda tem dois vales a serem vencidos para chegar à base do Itaguaré. Ou seja, mais escalaminhada a vista.
No meio da tarde o cansaço começou a bater em todos, diminuindo nosso ritmo e tornando nossas pausas mais constantes.
Por volta das 16:30 chegamos ao portal de pedra, próximo a base do Itaguaré. Aqui o trabalho de equipe foi fundamental para passarmos nossas mochilas. Na saída do portal, todos escutaram um barulho de água pingando bem ao nosso lado numa greta escura. Como não dava para ver nada, todos pensaram que era muito profundo para conseguir alcançar o precioso líquido.
Mas como eu tinha apenas meio litro de água, resolvi tentar chegar até aquela mina de ouro. Para minha surpresa, a água estava bem próxima e consegui tirar quase um litro daquela poça. Água escorria da pedra geladinha, que sorte! Só de pensar que há dois anos a única água que tinha naquela montanha era as que estavam nas bromélias.
Seguimos e às 17h chegamos ao nosso destino. Descontando a parada para almoço fizemos esse percurso em seis horas e meia de caminhada.
A chuva que estava nos perseguindo não chegou a cair. Armamos nossa barraca e preparamos um petisco de linguiça antes do jantar.
A lua novamente deu aquele show durante a noite, nem precisávamos de lanterna. Após o jantar, nosso amigo Tcheco Vava ensinou para nós um jogo de seu país. O jogo se chama “macartheck” (acho que é assim que se escreve). É um jogo de dados bem interessante, difícil de explicar, porém muito legal para integração do grupo.
Após terminamos com 300 ml de uma bela pinga mineira, fomos dormir. No dia seguinte como tínhamos tempo de sobra ninguém saiu da barraca até que o sol esquentasse e nos expulsasse dela.
Como o dia estava muito bonito, por volta das seis e quarenta pulei da barraca empolgado para subir o Itaguaré. Vivi disse que ficaria no acampamento meditando enquanto tentaríamos o cume, pois bem, sem minha menina partimos rumo aos 2.308 alt do Itaguaré.
Nem meia hora de escalaminhada e chegamos ao cume. Que visão fantástica! Ver todo o caminho percorrido no dia anterior foi magnífico! Eu particularmente achei a visão desta montanha muito melhor que a do Pico dos Marins.
Como não tínhamos pressa e nosso resgate só chegaria por volta das duas da tarde. Ficamos observando e admirando toda aquela paisagem. Mais ao norte a serra fina, ao leste todo vale do Paraíba e o contorno da serra da boicana, simplesmente sensacional, ao sul o Maris.
Depois de muito bate papo descemos ao acampamento base, arrumamos nossas coisas e iniciamos a descida de forma tranquila para não forçar os joelhos, diferente da trilha do Pico dos Marins, esta é feita sob uma bela e refrescante mata. Ao chegarmos ao primeiro cruzamento do rio paramos um belo banho, afinal fazia 3 dias que nossos corpos não sabiam o que um.
Meia hora de pausa e iniciamos a caminhada. Vivi, Sandro e Bisan foram à frente. Após, poucos minutos de caminhada escuto uma conversa entre os três num tom um pouco diferente.
Quando cheguei perto, vi uma jararacuçu descansando no meio da trilha. O Eduardo contou que o Sandro e a Vivi passaram por ela e não foram atacados. Que sorte! Reparamos que ela estava um pouco inchada e deduzimos que ela havia acabado de comer e por isso não deve ter atacado nenhum de nossos amigos.
Tiramos o ofídio do caminho com todo cuidado para não machuca-lo e seguimos nosso caminho e nem mais meia hora de caminhada chegamos ao local do resgate com uma hora de antecedência. Para a nossa sorte o resgate chegou pontualmente no horário marcado. Seguimos para ranchonete almoçamos e partimos para a pauliceia desvairada, chegando às 22h.
Enfim, mais uma travessia concluída, essa em especial, eu tinha que refazê-la para avaliar todas as impressões que eu tinha quando fiz pela primeira vez. Claro, tirando a parte do perrengue que passei por falta de água, esta travessia em minha opinião continua sendo uma das mais pesadas, se não a mais, das travessias clássicas das montanhas tupiniquins.

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